O mercado internacional de suco de laranja mudou tanto nas últimas décadas que os atuais preços recorde, por mais que beneficiem a cadeia produtiva brasileira no curto prazo, tornaram-se motivo de preocupação para as indústrias exportadoras. Ocorre que as cotações vêm sendo sustentadas por restrições na oferta global, decorrentes de problemas nos Estados Unidos e no Brasil, e a perda de competitividade da bebida em relação a concorrentes mais baratos está acelerando mudanças no perfil do consumo que, no longo prazo, podem reservar ao suco integral um papel cada vez mais secundário.
A tendência se reflete nas exportações do Brasil, que domina cerca de 75% dos embarques mundiais. Segundo a CitrusBR, entidade que representa as gigantes Cutrale, Citrosuco e Louis Dreyfus Company, de julho a dezembro do ano passado (os seis primeiros meses desta safra 2024/25), o volume vendido caiu quase 20%, para 430,1 mil toneladas equivalentes ao produto concentrado e congelado (FCOJ). Como essa queda deriva de uma menor disponibilidade de produto, a receita gerada cresceu 42,7%, para US$ 1,877 bilhão.
O movimento de retração estrutural da demanda global pelo suco de laranja 100% integral não é novo. Já era visível no início dos anos 2000, com a proliferação de refrescos e néctares de diversos sabores, normalmente diluídos – e preços menores nas gôndolas. As cotações internacionais, assim, passaram a ter uma fonte quase constante de pressão e a oscilar sob maior influência da oferta. Nos EUA, a doença conhecida como greening reduziu a produção a ponto de consolidar o país, antes um concorrente de peso do Brasil no exterior, em um dos maiores compradores de suco de laranja brasileiro. O Brasil também sofre com o greening, embora menos, e por aqui o principal vilâo nos últimos anos foi o clima.
“São cinco anos seguidos de safras pequenas ou médias de laranja no Brasil”, lembra Ibiapaba Netto, diretor-executivo da CitrusBR. Conforme o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), mantido com contribuições das indústrias e de produtores de laranja, na safra atual (2024/25) a colheita da fruta no cinturão que se espalha por São Paulo e Minas Gerais, o maior do mundo, deverá se limitar a 223 milhões de caixas de 40,8 quilos, 27% menos que em 2023/24. Essa baixa reduziu a produção e os estoques de suco, e abriu espaço para a disparada das cotações e seus reflexos.
Atualmente, a tonelada do FCOJ comercializado gira em torno de US$ 6,6 mil. O valor, referenciado em bolsa, é o dobro que o observado na temporada 2023/24, que já havia sido duas vezes superior ao de 2022/23. Com a melhora do clima, as projeções do segmento indicam que a safra de laranja voltará a crescer em São Paulo e Minas na próxima temporada (2025/26), para cerca de 300 milhões de caixas, mas para o consumo o cenário é turvo. “Com maior disponibilidade de suco e preços mais confortáveis, poderemos ver o consumo reagir. Mas algumas mudanças vieram para ficar”, diz Netto.
Principal destino das exportações mundiais, a Europa viu distribuidoras de suco quebrarem com a queda da demanda, e muitas das que continuam em operação diminuíram suas embalagens para manter as vendas. A preferência dos importadores pelo suco de laranja pronto para beber (NFC) se aprofundou, mas analistas pontuam que a própria confiabilidade no Brasil como fornecedor da bebida foi posta à prova, e novos néctares, refrescos e bebidas multifrutas chegaram às prateleiras e conquistaram maior espaço.
Com os elevados preços atuais da laranja – a caixa vendida às indústrias está girando em torno de R$ 90, segundo o Cepea/Esalq – , há novos investimentos em curso no Brasil na ampliação da produção de fruta, sobretudo em novas áreas até agora livres do greening. Mas a questão é saber se a demanda por suco de fato vai se recuperar diante das mudanças estruturais dos últimos anos. Se isso não acontecer e a oferta aumentar, há quem já vislumbre fortes perdas ao longo da cadeia produtiva nos próximos anos.
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